Humberto Lopes, Advogado e Político, se fosse vivo, faria hoje 100 anos.

 

 

Câmara Municipal de SantarémHUMBERTO Pereira Dinis LOPES, Advogado e Político, natural de Santarém, nasceu a 17-10-1919 e faleceu a 23-11-1984. Era filho de Humberto d’Amorim Diniz Lopes (1887-1940) e de Maria Judith Martins Pereira Diniz Lopes. Aos 21 anos, o seu pai, comerciante, vereador da Câmara Municipal no período anterior ao Estado Novo e dirigente associativo, morreu. A mãe passou a educar os seus três filhos, Joaquim, António e Humberto, sozinha, no difícil período do pós-Guerra Civil de Espanha e início da II Guerra Mundial.

Na década de 40 contactou com os membros activos do partido Comunista, Soeiro Pereira Gomes, Alves Redol e Pedro Santos Soares (1915-1975). A partir de 1941, passou a escrever com frequência para o jornal Correio da Extremadura / Ribatejo. Humberto Lopes concluiu o curso de direito na Universidade de Lisboa, em 1943 e casou-se com Arminda Santos Soares, passando ambos a integrar os quadros do partido Comunista. Como desejava exercer advocacia começou a estagiar no escritório de Manuel Ginestal Machado e, em Novembro de 1943, era o delegado interino do Procurador da República, em Santarém. Segundo o historiador João Madeira, no seu estudo Os Engenheiros de Almas. O Partido Comunista e os Intelectuais (1996), o jovem advogado foi recrutado pouco antes de terminar o curso, em 1942, para criar o Comité local do Partido, em Santarém.

A fim de executar a missão atribuída pelo Partido, Humberto Lopes passou a integrar as colectividades escalabitanas tornando-se sócio do Club Literário Guilherme de Azevedo, do Orfeão Scalabitano, da Sociedade Recreativa Operária, da Banda dos Bombeiros, da Associação Académica, do Círculo de Cultura Musical, dos Bombeiros Voluntários, do Grupo de Futebol Empregados no Comércio “Os Caixeiros”, do Círculo Cultural Scalabitano, da Alliance Française e do Grupo de Coordenação Cultural. Para João Madeira, o partido atribuía um conjunto de orientações para os militantes e simpatizantes intelectuais que “… passavam por entrar para sócios de agremiações desportivas e recreativas em meios operários, por procurarem desenvolver trabalho útil nesses meios, dando aulas ou promovendo sessões de leitura, ou ainda por averiguarem se nas suas relações, mesmo antigas, havia operários e camponeses de quem se pudessem aproximar para desenvolver um trabalho de esclarecimento e educação. O objectivo era, naturalmente, o recrutamento, embora isso não fosse, na maioria dos casos, imediato ou possível directamente, o que significava que deveriam, pelo menos, suscitar a sua aproximação ao Partido, passar o contacto para que, ulteriormente, o trabalho de aliciamento fosse consolidado e o recrutamento se pudesse fazer.” (p. 152). Humberto Lopes seguiu estas orientações e para além de delegado da Alliance, foi dirigente do Club Literário, do Orfeão e do Grupo de Coordenação que ajudou a fundar em 1944. Entre 1943 e 1946, presidiu à Comissão Executiva do Concurso Literário Ribatejano em que se envolveram algumas colectividades de Santarém.

Em 1944, envolveu-se no projecto do Club Literário Guilherme de Azevedo e do Grupo Pró-Cultura dos Empregados no Comércio para fundar o primeiro jardim-de-infância em Santarém. Este trabalho pioneiro durou apenas três meses, mas quer Humberto quer Arminda não abdicaram da necessidade de se criar uma instituição de ensino pré-escolar na Cidade.

Humberto Lopes foi preso pela primeira vez a 1 de Junho de 1946, sob a acusação de pertencer ao comité regional do “Médio Ribatejo” do Partido Comunista Português, usando o nome de “Júlio”. O advogado foi libertado do Aljube a 14 de Outubro de 1946 após o pagamento de fiança de 30 mil escudos. A 13 de Janeiro de 1948 e na sequência deste processo, foi condenado a 10 meses de prisão correccional, à suspensão dos seus direitos políticos por três anos e ao imposto de justiça de 800$00. Apenas foi libertado do Forte de Peniche a 13 de Julho de 1949.

A 30 de Junho de 1947, ainda participou no II Congresso do Ribatejo, em Santarém, onde apresentou a tese “As Colectividades Desportivas de um Novo Tipo” onde se referiu ao “aspecto educativo do desporto”. Segundo o congressista era “…raro haver a preocupação de dar aos atletas, em primeiro lugar, e aos associados, logo a seguir, um mínimo de cultura, que dá discernimento, compreensão e gosto apurado das formas superiores ao desporto. O ideal desportivo é o do atleta inteligente, porque só esse pode – em regra – ser o campeão, o perfeito executante da sua modalidade, porque, simultaneamente, perfeito raciocinador sobre os processos do seu jogo ou da sua arte.” (Actas, pp. 535-6). O dirigente associativo concluiu a sua tese propondo “… que se saúdem todas as colectividades desportivas, que numa atitude de pioneiros, têm dedicado a sua atenção a problemas de cultura; [e] que se exprima a esperança de dentro em pouco não haver, em todo o Ribatejo, uma única colectividade desportiva sem a sua biblioteca, o seu círculo de estudos, o seu programa de conferências e palestras culturais.” (Idem, 536-7). A 19 de Outubro de 1947, deslocou-se a Tomar no âmbito do mesmo Congresso onde apresentou as teses “O Problema do Analfabetismo”, “O Ensino Agrícola no Ribatejo” e “O Conhecimento da Terra Portuguesa, e em Especial do Ribatejo, através dos Livros Adoptados e dos Programas de Instrução Primário e do Liceu.

Em 1950, Humberto Lopes participou como testemunha no julgamento de Ruy Luís Gomes, Virgínia Moura e José Morgado, membros do Movimento Nacional Democrático acusados da publicação de nota oficiosa sobre o problema de Goa, Damão e Diu. Dois anos depois foi preso juntamente com os advogados Lino Lima e Carlos Cal Brandão “por ter requerido, num abaixo-assinado, ao Director dos Serviços Prisionais a tomada de “medidas adequadas para normalizar a situação existente, procedendo-se a um amplo e rigoroso inquérito” sobre a greve dos presos em Peniche em Dezembro desse ano.” (Vítimas de Salazar, pp. 160-1). O ministro da Justiça, Cavaleiro Ferreira, acusou os advogados de abusarem da sua profissão para «fins inconfessáveis» e por tentarem injuriar as autoridades.

Em 1953, foi novamente preso e condenado a dois anos e meio de prisão ao ser acusado da prática de factos delituosos que teria cometido como membro do partido Comunista, dissimulado na comissão distrital de Santarém do Movimento Nacional Democrático. O regime para vergar o advogado Manuel João da Palma Carlos moveu-lhe um processo e condenou-o sumariamente pela sua actuação no julgamento de Humberto Lopes, considerando injuriosa a afirmação de que os juízes podiam julgar como lhes apetecesse com prova ou sem prova, mas tinham que registar em acta tudo quanto se passava na audiência. O advogado foi de imediato transferido do banco da defesa para o banco dos réus, enquanto Arminda Soares foi presa por desrespeito ao Tribunal. O incidente teve dimensão internacional e solidariedade entre a oposição democrática.

Na prisão de Caxias foi alvo de um processo-crime, em 1954, sendo acusado de fazer parte da organização prisional do P.C.P., juntamente com outros militantes do partido como o cunhado Pedro Soares. Em 1957, passou para a cadeia de Peniche, onde acompanhou a fuga de Álvaro Cunhal e outros companheiros, como Pedro Soares, três anos depois. Em 1963, continuava preso apesar de ter cumprido a pena a que fora condenado. Nesse período, Arminda Soares enviou cartas ao deputado da Nação, Artur Proença Duarte, onde relatava as péssimas condições em que o marido estava detido.

Em 1973, Humberto Lopes pertenceu à Comissão Nacional do III Congresso da Oposição Democrática por Santarém, integrando a Comissão de Desenvolvimento Regional e Administração Local.

Na década de 70, casou em segundas núpcias com Isabel Maria Beja Calado Diniz Lopes. Dessa união nasceram cinco filhos: Judite Isabel, Humberto Joaquim, António José, Rui Guilherme e Pedro Manuel.

Após o 25 de Abril de 1974, desempenhou cargos autárquicos e associativos, esteve ligado à Misericórdia de Santarém e à delegação de Santarém da Ordem dos Advogados. Esta última entregou-lhe o “prémio Alves de Sá” por livros jurídicos elaborados enquanto se encontrava detido por «crimes políticos».

O seu nome faz parte da Toponímia de: Santarém (Avenida e Rua Doutor Humberto Lopes)

Fonte: “Jornal Correio do Ribatejo” (por Teresa Lopes Moreira).

Fonte: “Candidatos da Oposição à Assembleia~Nacional do Estado Novo (1945-1973). Um Dicionário”, (de Mário Matos e Lemos, Luís Reis Torgal, Coordenador, Colecção Parlamento, Edição da Assembleia da República, 1ª Edição, Lisboa, Outubro de 2009, Pág. 191 e 192).

No comments yet

Deixe um comentário